Monday, January 19, 2015

Whiplash: Em Busca da Perfeição

Uma das características mais marcantes de Damien Chazelle enquanto roteirista é sua tendência à subversão. O fraco O Último Exorcismo – Parte 2 buscava construir um terror real ao desconstruir a farsa que era o primeiro filme, no qual as coisas não eram realmente o que aparentavam. Já em Toque de Mestre, ele buscava as referências a Alfred Hitchcock para transformar o filme em uma experiência hitchcockiana em todos seus atributos.

Outro traço do cinema de Chazelle reside em sua paixão pela música, utilizada como forma de libertação em O Último Exorcismo 2 e convertida em MacGuffin em Toque de Mestre. Seu primeiro filme na direção, inclusive, Guy and Madeline on a Park Bench, possuía uma trompetista de jazz como protagonista. Por isso, Whiplash: Em Busca da Perfeição soa como um próximo passo natural do cineasta ao retornar ao jazz para buscar sua nova subversão fílmica: não existe, afinal, ritmo mais transgressor do que aquele que lançou Buddy Rich, Jo Jones e Charlie Parker à eternidade.

O objeto que o diretor busca transformar perante o espectador é a expectativa. Desavisados podem pensar em Whiplash como mais um longa que revive a dinâmica de mestre-aprendiz vista tantas vezes e eternizada em longas como Ao Mestre, com Carinho e Karatê Kid. É justamente aí que entra a sagacidade de uma direção que, econômica, em vez de investir em emoção e redenção com o auxílio da trilha sonora, aproxima seu olhar dos protagonistas, testando os limites de seu público com um suspense palpável e a esperteza de um texto que estabelece a relação entre dois homens falhos com nada em comum exceto pelo amor e a dedicação à música.

O desenho tridimensional dos personagens fica muito claro em diversos momentos, mas dois deles são dignos de nota. No primeiro, Andrew (Miles Teller) coloca seus estudos sob a batuta do maestro Fletcher (J.K. Simmons) no Conservatório Shaffer, uma das melhores escolas de música do planeta, e sua futura carreira como baterista de jazz acima de seu namoro e resolve terminar seu relacionamento com a jovem Nicole (Melissa Benoist) de modo duro. No segundo, Fletcher, respeitado e temido pelo seu conhecimento e por seus métodos de trabalho (mais parecidos com o Sargento Hartman de Nascido Para Matar do que com o Mestre Miyagi), derrama lágrimas ao noticiar a morte de um ex-aluno.

Cenas chocantes que fazem o espectador questionar suas opiniões acerca dos personagens e revelam a inteligência de Whiplash. De repente, um não é mais tão doce e indefeso, e o outro não é totalmente desprovido de sentimentos, o que contrasta com traços antes mostrados (a relação de Andrew com o pai vivido por Paul Reiser, o fato de Fletcher claramente preferir para si músicos que não eram titulares em suas respectivas bandas) e compõe de maneira verossímil os homens que vemos na tela.

A direção de Damien Chazelle é eficaz em estabelecer as humilhações a que o professor submete Andrew em busca da excelência, com seus close-ups e planos fechados em mãos e bateria encharcadas de sangue e suor, e com o auxílio do excelente trabalho de som, digno de prêmios, que é um dos grandes responsáveis pela impressão de que o longa só será completamente compreendido se assistido em uma sala de cinema.

Ao lado, claro, de J.K. Simmons, cuja performance é para ser apreciada em tela grande. Seu Terence Fletcher é um achado, uma versão insana do Mr. Holland de Adorável Professor, e parece engolir o filme em cada cena (apesar de Miles Teller responder à altura em muitos momentos). No fim das contas, a crueldade e a paixão do maestro (que chega a dizer que “não há duas palavras mais danosas do que ‘bom trabalho’”) acabam por se encaixarem na visão do jovem cineasta, que aos 29 anos parece ter muito a dizer sobre o papel dos filmes na sociedade. Para ele, o Cinema não teria ajudado tanto a transformar o mundo se fosse apenas composto por obras chapa-branca. Ninguém se torna mestre se for complacente o tempo todo.

Whiplash, Damien Chazelle, 2014 

1 comment:

Raquel Raposo said...

Amei o filme!
O filme é tão bom que dá vontade de assistir de novo na próxima sessão.