David Cronenberg ficou famoso por ser um diretor que fazia um mergulho intenso na mente de seus personagens. Nesse mergulho, ele encontrava a obsessão de seu protagonista, e a trazia para fora da carne, algumas vezes mesclando corpo e mente, em imagens assombrosas (foi assim na horrenda transformação de Jeff Goldblum em A Mosca, por exemplo). Nos últimos anos, no entanto, o cineasta vinha percorrendo um caminho diferente com a sua filmografia, ainda estudando seus personagens de forma eficiente, como prova a quase obra-prima Marcas da Violência, mas por vezes caindo em uma armadilha acadêmica tão perigosa quanto decepcionante.
Bem, nesse ponto, Cosmópolis é um retorno de Cronenberg ao experimentalismo e ao controle narrativo. Se no recente Um Método Perigoso o diretor parecia um pouco desconfortável ao comandar um longa de forma comportada, agora ele pisa em terreno conhecido, ao retratar um fatídico dia na vida e na cabeça de Eric Packer, um jovem e bilionário empresário do mundo financeiro. Enquanto atravessa a cidade em busca de um corte de cabelo, a bolsa o surpreende e a fortuna do prodígio diminui consideravelmente. Nesse tempo, vemos o protagonista ter conversas com empregados, com um médico (que afirma que Packer tem a "próstata assimétrica", o que gera uma alegoria tão absurda que chega a divertir), fazer sexo algumas vezes, e se entregar de vez à falta de rumo. É aí que Cronenberg dá o golpe final, e realiza a mutação presente em seus melhores filmes.
O que poderia ser um problema (o fato de a obsessão de Packer, os números, ser algo tão significante quanto abstrato) acaba sendo uma grande jogada por parte do cineasta, também autor do roteiro, que vai expondo conversas ora de cunho pessoal, ora profissional, até o derradeiro momento em que tudo se mistura de forma impressionante. Aí, os diálogos mesclam psicologia e filosofia econômica de forma tão fluida que quase podemos enxergar os personagens como números flutuando de forma efêmera na tela. Aí o quebra-cabeça termina, montadinho, e tão desconcertante que a violência nem precisa ser exibida, apenas a sugestão basta para que a desilusão apareça e a imagem de um mundo decadente esteja completa.
Cosmopolis, David Cronenberg, 2012 

3 comments:
os diálogos do filme são insuportáveis. a vida do cara é um saco
Ah, nem falei do ótimo trabalho de Robert Pattinson.
Acho que nunca fiquei tão angustiada com um filme quanto fiquei com esse.
Não gostei nadinha...
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