Miss Violence,
dirigido pelo grego Alexandros Avranas, é o caso de filme que tenta ser parte
de uma tendência, na corrente de longas (geralmente de fora dos grandes polos)
que partem da abordagem (seca, apostando em estratégias que envolvem ambientes
e enquadramentos fechados e trilha sonora diegética) para serem tomados, através
de sua dureza, por cinema-denúncia. A Romênia é o maior expoente (e não a
inventora) desse cinema nos anos 2000, e nos últimos anos países que vivem
relações socioeconômicas distantes do primeiro mundo começaram também a emular
o apelidado Novo Cinema Romeno.
Assim
como em outros filmes que se encaixem no estilo, a situação econômica do país,
no caso a Grécia, estão sob a superfície, influenciando nocivamente o ambiente.
A trama, escrita por Avranas em parceria com Kostas Peroulis, se inicia a
partir da morte da jovem Angeliki, que se jogou da sacada de seu apartamento no
dia em que comemorava seu 11º aniversário. A polícia (que fatalmente aciona o
serviço social) inicia uma investigação acerca do aparente suicídio, mas por
alguma razão a família da menina encara o caso como um acidente e reage
estranhamente bem ao falecimento. Aos poucos o espectador é levado para dentro
do convívio daquela casa e assiste aos constantes abusos físicos e psicológicos
infligidos às crianças da família (os irmãos de Angeliki e a irmã de sua mãe)
pelos avós.
Os
primeiros minutos da obra são intrigantes. O suicídio de Angeliki (que salta da
janela com um sorriso no rosto) e a sequencia do interrogatório levam o
espectador a acreditar que Miss Violence
é um filme sobre o luto. As cenas subsequentes, que começam a desmontar essa
impressão, funcionam frustrando expectativas e direcionando a narrativa em
direção a escancarar a situação, o que deveria ser louvável. O problema é que
Avranas decide por uma abordagem perigosa, que busca ser denúncia sem ser
agente, apenas assistindo aos atos terríveis praticados principalmente pelo
patriarca vivido por Themis Panou tendo as filhas Myrto (Sissy Toumasi) e Eleni
(Eleni Roussinou), a mãe de Angeliki, como principais vítimas.
E
a passividade geralmente se confunde com fetiche em casos como esse (algo
semelhante foi visto no mexicano Depois
de Lúcia, exibido por aqui em 2013). Com tal postura voyeurística, o
diretor (vencedor do Leão de Prata em Veneza 2013) não parece interessado em discutir
os temas que a trama abraça, transformando o longa em um sádico e
sensacionalista estudo de personagem, que acaba por vilanizar sem denunciar,
numa filosofia que aparenta dizer “o mundo é assim, existem pessoas ruins e não
há nada que possamos fazer”, como fica claro na sequência em que a pequenina
Alkmini dança em frente ao amigo de seu avô.
É
um típico filme que se inspira no cinema praticado por diretores como Cristian
Mungiu, mas que erra o alvo, resultando no clássico “lobo em pele de cordeiro”:
uma casca de boas intenções, mas uma realização maligna. Não creio que essa
tenha sido a intenção de Avranas em seu segundo filme, mas Miss Violence, no excesso de vontade, acaba por confundir um conto
moral com moralismo, e sua apatia no retrato (que pode ser facilmente tomada
por desprezo pelo caso, ou, pior, pelas vítimas) transforma seu filme na
verdade, em vez da representação dela.
1 comment:
Eu concordo com muito do que você diz, mas o estranhamento que o filme me causou me fez gostar dele.
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