Homem-Formiga era um projeto
cuja popularidade estava assegurada desde que Guardiões da Galáxia se tornou um dos grandes sucessos comerciais
de 2014. Com aquela deliciosa aventura com ecos de Star Wars, a Marvel recebia a resposta que tanto precisava para
partir sem medo rumo ao desafio de apresentar heróis menores à massa de
não-leitores de gibis que vai aos cinemas. Entretanto, era inegável que todo o
processo de feitura do longa-metragem (que envolveu uma polêmica troca de
diretores) deixou o fã com a pulga atrás da orelha. Outros pontos também eram
vistos com desconfiança: além da controversa decisão de focar a narrativa em
Scott Lang, que nos quadrinhos foi o segundo Formiga, havia a questão (sempre
complicada) do roteiro ter sido mexido após a troca no comando da empreitada.
Sem falar da pergunta que não queria calar: cadê a Vespa no meio disso tudo?
Mas Homem-Formiga
é um dos projetos mais inusitados do ano, ao conseguir ser ao mesmo tempo
coerente com o Universo Cinematográfico Marvel, costurando suas conexões de
maneira sutil, e um dos passatempos mais descompromissados da Casa das Ideias.
A trama, como já citado, é focada em Scott Lang (Paul Rudd), ladrão que é
abordado pelo milionário Hank Pym (Michael Douglas), que propõe ao protagonista
envergar o uniforme do herói-título, no passado o alter-ego do próprio magnata.
A missão que Lang recebe envolve o roubo de uma invenção extremamente perigosa
para o futuro da humanidade, e que é guardada a sete chaves no prédio da
gigantesca corporação liderada por Darren Cross (Corey Stoll). Essa invenção é
uma versão moderna da tecnologia que Pym criou no passado, e que é a
responsável por fazer com que o Homem-Formiga mude de tamanho. Para conseguir
ser bem-sucedido na operação, Scott conta com o auxílio de seus comparsas Luis
(Michael Peña, ótimo), Kurt (Dave Dastmalchian) e Dave (T.I.), além de Hope,
que auxilia Pym, seu pai no treinamento de seu substituto.
Em linhas gerais, o longa de Peyton Reed (que
entrou no lugar de Edgar Wright) é mais um filme de origem, como manda o Manual
de Primeiros Filmes de Super-Heróis. Os personagens e tramas são apresentados
de maneira didática e o vilão (o ponto mais fraco da produção) não difere muito de Obadiah Stane, que Jeff
Bridges encarnava em Homem de Ferro,
de 2008. O grande charme aqui (assim como também o era na primeira aventura de
Tony Stark nos cinemas) é o timing cômico de seu protagonista. Paul Rudd
parecia uma aposta arriscada, mas a composição de seu Scott casa perfeitamente
com o tom bem-humorado do texto (assinado por Wright, Joe Cornish, Adam McKay e
o próprio Rudd), que trata de forma blasé, quase piscando para o espectador, o
paralelo entre a dinâmica pai e filha de Hank com Hope e de Scott com Cassie (a
lindinha Abby Ryder Fortson).
E a leveza se estende além do desenho dos
personagens. A confecção da relação da trama de Homem-Formiga com os outros longas da Marvel Studios é feita também
na base da despretensão (com exceção da geralmente urgente cena pós-créditos),
assim como as citações feitas para agradar aos leitores mais antigos (gosto
particularmente do momento em que um personagem diz “Tales to Astonish!” como
se fosse nada). No entanto, é um pouco decepcionante que tanta desafetação se
confunda com preguiça quando o espectador é forçado a assistir a momentos
batidos como a montagem que exibe o treinamento do herói, ou qualquer diálogo
de Scott com a ex-mulher (vivida por Judy Greer) ou com o policial Paxton
(Bobby Cannavale).
Felizmente, são detalhes pequenos se
comparados à maravilha que é assistir a algumas sequências que desde já se
destacam entre as melhores de todos os filmes da Marvel, como a primeira vez em
que Lang veste o traje no banheiro, e a cena da invasão à Pym Technologies, que
parece uma fusão de Missão: Impossível
com Querida, Encolhi as Crianças. Os
efeitos visuais, incríveis, se aproveitam do fato de um homem minúsculo agindo
em meio a objetos que parecem gigantescos ser algo fascinante (apesar de nada
original), para a composição de cenas que impressionam por serem ao mesmo tempo
cheias de gravidade e humor. Impossível não rir no momento em que um celular
começa a tocar Disintegration, do The Cure enquanto o mocinho encara o vilão
Jaqueta Amarela dentro de uma maleta.
Tudo isso (do bom-humor às mudanças
pontuais em relação ao cânone) leva a um clímax surpreendente, que vai do
curioso (o local onde o embate final entre herói e vilão acontece proporciona
tiradas quase geniais, com a ajuda da montagem, que permite que vejamos com
clareza a destruição diminuta da luta) ao belo, no momento em que o Homem-Formiga
decide se sacrificar para salvar o dia, embarcando em uma viagem psicodélica
rumo ao nada. Tal sequencia faz par justamente com a melhor cena envolvendo Michael
Douglas e Evangeline Lilly, na qual Hank Pym conta à filha o que realmente
houve com a mãe da moça (respondendo – junto com a cena que surge durante os
créditos finais – ao questionamento lá do primeiro parágrafo), em um flashback
belíssimo.
É em momentos como esse que o espectador
percebe que pode ter assistido, no meio de tanta ação diminuta (envolvendo um
trenzinho de brinquedo e um exército de formigas), a um filme gigante em sua aparente
falta de ambição.
Ant-Man, Peyton Reed,
2015 ½
1 comment:
Ah!! Muito divertido!
Amei o filme e o texto! ^-^
Post a Comment