Tuesday, June 21, 2016

Boneco do Mal

Filmes de terror ambientados completamente, ou quase, dentro de um mesmo local (uma casa, um hotel, ou coisa do tipo) são uma armadilha: ao mesmo tempo em que representam possibilidade interessante de sucesso comercial (economia em cenários representa uma produção mais barata e, por consequência, menos riscos nas bilheterias), narrativamente dependem de um roteiro esperto com os clichês do subgênero “casa mal-assombrada” e de um diretor habilidoso para explorar os cômodos de modo a conferir um ar realmente assustador à ambientação.

Boneco do Mal cai nessa armadilha logo desde o princípio. É claramente um “filme de produtor” – produtores, no caso – ao embarcar na onda de sucessos recentes (Annabelle é uma inspiração clara) e vê-se que Jason Blum (A Visita, Sobrenatural, A Forca, A Entidade) fez escola em seus investimentos em projetos de lucratividade garantida apesar do resultado artístico nem sempre convincente. Infelizmente, o projeto não conta com uma equipe criativa capaz de utilizar os lugares-comuns do estilo em favor da narrativa, e acaba naufragando em um mar de referências desencontradas (do já citado Annabelle, passando obviamente por Brinquedo Assassino, até chegar a Tobe Hooper) e nenhum ponto forte.

A trama, escrita por Stacey Menear, não apresenta novidades: Greta (Lauren Cohan) é uma americana que se muda para o Reino Unido a fim de deixar um passado recente nebuloso para trás, e que acaba aceitando o emprego de babá de Brahms, filho do casal Heelshire (Jim Norton e Diana Hardcastle), que sai de férias. Greta se surpreende, no entanto, ao saber que Brahms é na verdade um boneco, em que os Heelshire acreditam habitar o espírito do filho. Apesar de inicialmente achar cômico ter que cuidar de um boneco, aos poucos, logicamente, a jovem, auxiliada por Malcolm (Rupert Evans), dono do mercado local, vai perceber que não está sozinha na mansão.

Existem alguns pedaços de filmes convivendo em Boneco do Mal (a fuga do passado, a casa assombrada, os velhos aparentemente loucos, o britânico boa-praça que se apaixona pela protagonista e a ajuda a resolver o mistério), e nenhum deles funciona. O texto de Menear em momento algum consegue se aprofundar no trauma vivido pela protagonista nos EUA, resolvendo tudo em um diálogo expositivo perto da reta final. Fica a impressão de que a mudança se deu apenas porque o interior das cidades inglesas é mais assustador do que Montana. E falta ao diretor William Brent Bell talento para conduzir sustos e tensão no campo da sugestão.

Suas intenções são boas. Bell, que recentemente fez certo barulho entre os fãs de terror com Filha do Mal e Wer, tenta fazer a escolha correta ao tentar construir um clima de suspense preparando o terreno para um terceiro ato revelador, mas esbarra em suas próprias limitações. Percebe-se a tentativa de se criar um sub House of the Devil, um dos grandes filmes de horror dos anos 2000, com seus dois primeiros atos em que Greta – e o espectador – primeiro duvida, depois questiona, e por fim aceita o absurdo da situação, apenas para demolir tudo nos minutos finais, mas o comportamento da protagonista torna a experiência difícil de digerir.

Ao assistirmos um filme que tenha um mistério a ser resolvido, seja suspense ou terror, topamos muitas vezes com o inverossímil. Por isso, as decisões de Greta acerca de como tratar o boneco e de permanecer vivendo na casa mesmo apesar do claro perigo que a ronda são razoavelmente aceitáveis. São concessões que fazemos. É difícil engolir, no entanto, a reação da protagonista em relação à introdução de certo personagem no terceiro ato. É tão absurdo que nem Malcolm, adoravelmente estúpido desde o princípio, acreditou.

Fica difícil para o diretor, sabotado por um roteiro que imbeciliza a protagonista, conseguir algum resultado decente. A solução do mistério, que tenta amarrar as pontas do drama pessoal de Greta e do passado de Brahms, é mambembe, ao emular O Massacre da Serra Elétrica e se apoiar na sequencia de suicídio mais estúpida dos últimos anos. Nesse contexto, a insistência de Bell em aplicar sustos com o auxílio de notas altas da mais genérica das trilhas sonoras e em conferir gravidade a sequencias de sonho é um triste complemento. Greta ri quando percebe que terá que tomar conta de um boneco. É lamentável perceber que a única resposta que Boneco do Mal consegue do seu público é o mesmo deboche.

The Boy, William Brent Bell, 2016 ½

2 comments:

Raquel Raposo said...

Esse filme é horroroso!!!
HORROROSO!! Odiei isso. uu

joão said...

otimo texto. e o filme e bem ruim mesmo