Poucas
coisas são mais decepcionantes para a experiência cinematográfica de qualquer
pessoa do que a expectativa frustrada. E Esquadrão
Suicida foi um projeto que nasceu sob muita expectativa, por ser um filme
que enfocaria a força-tarefa integrada por vilões, a maior parte deles postos na cadeia por Batman (Ben Affleck), em missões de altíssimo
risco em troca da diminuição de suas penas. A escalação do diretor David Ayer
também gerou furor, pelo seu histórico de filmes urbanos e violentos. O
boca-a-boca dava conta de uma adaptação de HQs mordaz, com ação e suspense em
doses cavalares, o que só foi confirmado pelos primeiros trailers divulgados.
Primeiro,
a trama: escrita pelo próprio Ayer, acompanha os primeiros passos do esquadrão
idealizado pela executiva Amanda Waller, que consegue convencer a Casa Branca a
bancar o grupo formado pelos prisioneiros Pistoleiro (Will Smith), Arlequina
(Margot Robbie), El Diablo (Jay Hernandez), Crocodilo (Adewale Akinnuoye-Agbaje),
Capitão Bumerangue (Jai Courtney) e Amarra (Adam Beach), que são chefiados e
contidos em campo pelo militar Rick Flag (Joel Kinnaman) e Katana (Karen
Fukuhara). A carta na manga de Waller é Magia, bruxa milenar que se apoderou do
corpo da doutora June Moone (Cara Delevingne), que aparenta estar sob controle
da líder da equipe perante o governo. Em algum momento, porém, as coisas saem
do controle e os condenados precisarão concentrar seus esforços em conter Magia
e seus planos de dominação mundial. Enquanto isso, Coringa (Jared Leto, em uma
composição perdida entre o ameaçador e o ridículo) arquiteta o plano para
resgatar sua namorada Arlequina de volta para seu bando.
A
escalada dramática pensada por David Ayer é parecida com seus trabalhos
anteriores, como o recente Corações de
Ferro (2014) e o ótimo Marcados para Morrer (2012), seu melhor filme:
após o espaço e a trama serem estabelecidos, os protagonistas têm espaço para
trabalharem suas relações. O elenco, no entanto, é burocrático, e não consegue
fazer muito com o pouco destaque que seus personagens recebem (eu confesso que
gostaria de ter visto mais do passado trágico de El Diablo, ou do drama pessoal
de Katana). As exceções são os flashbacks envolvendo Pistoleiro, que tem tempo
para aprofundar sua relação com a filha, e o namoro doente de Coringa e
Arlequina.
As
mudanças ocorridas entre os momentos de concepção e realização do primeiro
filme estrelado pelo supergrupo de vilões da DC Comics são provas cabais do
efeito nocivo que a influência dos estúdios pode ter nas franquias que chegam
aos cinemas do mundo. Inicialmente pensado – e parcialmente filmado, inclusive
– como uma sombria adaptação de HQs, Esquadrão
Suicida sofreu mudanças após o sisudo Batman
vs. Superman: A Origem da Justiça (também um produto DC/Warner) ser um
fracasso de crítica e o tom de sátira de Deadpool
(anti-herói da Marvel sob tutela dos estúdios Fox) ser um sucesso inesperado.
Seguindo
a ditadura do momento, o elenco foi convocado para regravar algumas cenas,
inseridas mais tarde na ilha de edição para dar a Esquadrão Suicida um ar mais debochado. O produto não é muito
diferente da reinvenção de Quarteto
Fantástico (o diretor Josh Trank também tinha um outro filme em mente, que
ele alega ter sido completamente modificado pelo estúdio), de 2015: um longa
que não encontra seu timing, sempre perdido em um limbo entre a proposta
inicial de Ayer – que idealizou um longa que em tom lembraria mais seu policial Tempos de Violência (2005) – e as piadas exigidas pelos engravatados.
Essa
indecisão acerca dos rumos da narrativa fica muito clara em como o diretor não
consegue montar com competência o primeiro ato da trama. As muitas cores que
poluem a imagem não casam com a fotografia escura de Roman Vasyanov e os
letreiros que apresentam os anti-heróis em alta velocidade acabam por
demonstrar o insucesso do roteiro do próprio Ayer em escrever seus personagens
com certa tridimensionalidade, em vez de dar à trama uma agilidade que o
afastaria dos épicos de super-heróis dirigidos por Zack Snyder.
Por
falar em Snyder, é triste constatar que, apesar de tentar, Esquadrão Suicida
não consegue evitar os erros em sua realização. Assim como Batman vs. Superman era um filme muito menos preocupado em
apresentar boas cenas do que em mitificar seus personagens (que jamais eram
desenvolvidos satisfatoriamente), Ayer também sacrifica boas sequências em prol
da canonização de momentos-chave. Isso é comprovado pelo close dos cartuchos de
metralhadora caindo no chão ou enquanto Arlequina encara em câmera-lenta
inimigos com seu taco de beisebol na primeira missão do esquadrão suicida. Um
cinema orgasmático, herança das explosões sem sentido de Michael Bay, e que não
se importa em construir a ação, apenas em mostrá-la.
O
resultado é um clímax de uma hora, em que o objetivo da missão se perde em meio
a pancadaria mal filmada (as cenas cortadas em excesso ficam inexplicáveis,
além de o espectador nunca ver a equipe trabalhando em conjunto, o que
enfraquece a ação) e efeitos especiais meia-boca. Não existe aqui um centro
dramático, e parece puro descuido transformar os dramas pessoais do Pistoleiro
e o romance aloprado de Coringa e Arlequina em destaques do longa, que
claramente entende Magia e Flag como protagonistas de sua trama.
David
Ayer tem dado entrevistas com expressão emburrada, os executivos da Warner não
se pronunciam. Ninguém acusa ninguém, e no fim das contas o filme ficou pelo meio do caminho. Sem
conseguir caminhar entre o suspense e as gags, a aventura tem cara de
mal-ajambrada ou, pior, inacabada. A reta final, que se rende ao raio azul que
já destruiu 2/3 das cidades retratadas em blockbusters, não dá conta de
encerrar a ação de maneira decente, nem se preocupa em amarrar as pontas que os
flashbacks explicativos deixaram soltas na primeira metade de projeção. A
princípio, Esquadrão Suicida
aparentava ser uma obra que seria bem-sucedida, mas acabou derrotada pelos seus
próprios erros, como os mais incompetentes vilões dos quadrinhos.
Suicide Squad,
David Ayer, 2016 ½
1 comment:
Texto lindo!! <3
Filme muito ruim. Achei Will Smith o dono do filme, mas fiquei bolada por isso pq é um filme de equipe...
Muita coisa não fez sentido pra mim, e acho que aquele cara que escala só foi chamado pra mostrar que o dispositivo de explodir cabeças realmente funcionava.
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