Independentemente
de suas qualidades ou defeitos, todo o clima que antecedeu o lançamento de Warcraft é muito injusto. Afinal, é
muito complicado uma produção ser considerada sozinha a salvação de todo um
subgênero que há mais de vinte não dá muito mais do que desgosto para seus fãs.
Com exceções pontuais, as adaptações de games para o cinema são sinônimo de
decepção para um público que cresceu próximo aos jogos e a seus personagens.
Portanto, o ato de reconhecer antecipadamente e de maneira desesperada o longa
de estreia da potencial franquia como a redenção dos filmes de videogame é,
apesar de compreensível, perigoso.
No
entanto, é interessante e de certa forma louvável o fato de a Blizzard Entertainment,
a desenvolvedora dos jogos que serviram de base para a produção, reconhecer a
pressão e se dispor a bancar o filme por conta própria, tendo exercido controle
sobre o processo de feitura da obra e, em caso de inevitáveis mudanças e
condensações na trama, ser a responsável pelo sucesso ou falha da empreitada. A
própria contratação do diretor Duncan Jones, fã confesso da série, tem
o dedo da empresa.
As
rédeas curtas da produtora e a intimidade de seu diretor com o material
original renderam bons frutos para os fãs. Warcraft
– O Primeiro Encontro de Dois Mundos é, em cada um de seus minutos, um
filme que presta reverência ao material original. Desde os fan services mais
dispensáveis (os anões que aparecem na primeira cena do herói vivido por Travis
Fimmel) até a construção de cenários que primam pelos detalhes, trabalho do
diretor de arte Gavin Bocquet que é enriquecido pela fotografia de Simon
Duggan, tudo tem cara de tributo.
A
trama, escrita por Charles Leavitt e pelo próprio Jones, acompanha o momento em
que os orcs, chefiados por e auxiliados pela magia de Gul’Dan (Daniel Wu),
partem para a invasão do mundo dos homens, chamado Azeroth. Os planos dos orcs
são combatidos pelo rei Llane (Dominic Cooper), ao lado do guerreiro Lothar
(Fimmel), da orquisa Garona (Paula Patton) e do aprendiz de feiticeiro Khadgar
(Ben Schnetzer), ajudados pelo Guardião Medivh (Ben Foster), uma espécie de
mago supremo do local. Enquanto isso, ao perceber a maldade e questionar as decisões
de Gul’Dan, um orc, Durotan (Toby Kebbell), tenta conter seu líder traçando um
pacto com os humanos, contando com o auxílio de Garona.
Warcraft não
faz concessões: jamais busca explicar demais suas criaturas e locais (que
possuem nomes que explicitam a inspiração em Tolkien, como Kharazan, Draenor e
Ventobravo). Tais explanações facilitariam a vida do público geral, mas soariam como informação desnecessária para os jogadores mais assíduos, que desde o
início foram as maiores preocupações do projeto. Tal decisão contrasta com a
aura de salvador dos filmes baseados em jogos, pois, para ser considerado efetivamente
como tal, o longa deveria conseguir – ou pelo menos tentar – alcançar a todos,
gamers ou não.
Apesar
disso, este não é o filme mais complicado do mundo. Seu texto simples dispensa
até mesmo um conhecimento prévio da Alta Fantasia, gênero no qual a Blizzard
baseia seu produto mais famoso. E a linguagem acessível de Duncan Jones também
auxilia o espectador, com sua abordagem visual clara que evoca sensações de perigo
ou calmaria apenas por seu uso das cores (azul: magia boa, verde: magia ruim; a
cena em que um bebê adquire uma cor diferente ao ser “contaminado” pela feitiçaria
de Gul’Dan, por exemplo, é das mais tocantes). É difícil se perder na coerência
com a qual o diretor estabelece seu universo.
Infelizmente,
Jones não consegue ser tão claro nas cenas de batalha. Seus cortes em excesso
(que não fazem par com a narrativa contemplativa de Lunar, a quase obra-prima que lançou o cineasta) enfraquecem os combates,
deixando-os por vezes incompreensíveis, um problema que não pode ser ignorado
em uma obra que baseia sua meia-hora final na pancadaria. Uma câmera menos
epiléptica e um ou outro plano-sequência dariam ao filme um terceiro ato para
ser lembrado.
Entretanto,
o que Warcraft tem de memorável
mesmo é Azeroth. No fim das contas, é esse o maior presente do filme para seu
público, não importando se os espectadores são amantes do material original.
Com técnica minuciosa, tanto cenários quanto criaturas digitais jamais soam
falsas. O plano que abre a narrativa, fechadíssimo no rosto de Durotan,
inclusive, é prova da confiança que todos tinham na beleza de sua tecnologia.
Sendo uma trama vinda do mundo dos games, deixar o visual como lembrança deve
ser uma honra. Após bombas como Super
Mario Bros., Double Dragon, Doom e Prince of Persia (entre muitos outros), ser relevante já é um
grande avanço.
Warcraft,
Duncan Jones, 2016
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