Friday, April 07, 2017

The Devil's Candy

Apesar de ter dirigido apenas dois longas-metragens até o momento, Sean Byrne já pode ser considerado um dos diretores mais talentosos do cinema australiano atual – que vive ótima fase, diga-se de passagem – ao lado de cineastas em seus primeiros filmes, como Jennifer Kent e David Michôd, e de outros mais experientes, como John Hillcoat. No entanto, diferente do que se possa imaginar, Byrne não se destaca pela originalidade em suas tramas (como Kent) ou sua visão de mundo (característica que vem se tornando marca de Michôd): seus filmes carregam uma bandeira de terror bem feito e barato, reciclando e subvertendo tramas clássicas do gênero.

E se Entes Queridos (2009), sua estreia, abordava a velha história do baile de formatura que se transforma em uma noite de terror, The Devil’s Candy bebe de fonte distinta, mas igualmente comum. Saem as influências do horror jovem e que aborda o desabrochar da sexualidade, de Carrie, a Estranha (De Palma, 1976) à franquia Sexta-Feira 13, e entram as casas mal-assombradas e demônios cujas vozes transformam os personagens em assassinos.

A trama, escrita pelo próprio Byrne, acompanha uma família que se muda para uma nova casa, comprada por ótimo preço. Uma tragédia recente ocorrida no lugar afastou outros possíveis compradores. Os Hellman, no entanto, resolvem adquirir o terreno. A família parece bastante unida a princípio, mas não demora muito até que o pai, o pintor Jesse (Ethan Embry), passe a ouvir vozes que o fazem desenhar imagens assustadoras de crianças torturadas e a se afastar da esposa Astrid (Shiri Appleby) e da filha Zooey (Kiara Glasco). E tudo parece piorar de forma infernal quando Ray Smilie (Pruitt Taylor Vince), antigo morador da casa, desenvolve obsessão por Zooey e tenta sequestrá-la.

A despeito do texto pouco original, que revisita tipos clássicos do horror – impossível não lembrar de O Iluminado (Kubrick, 1980), com o quadro que Jesse pinta substituindo o livro nunca terminado de Jack Torrance – existe um carisma inerente ao elenco (muito bem dirigido), e pelo menos um traço que refresca a narrativa e a torna imprevisível: a trilha sonora fundamentada no Heavy Metal, que além de ajudar a estabelecer a relação entre os protagonistas, especialmente a proximidade entre Jesse e Zooey, funciona como um personagem ao participar da trama de forma orgânica, desde a primeira cena, em que um homem perturbado toca acordes altíssimos em uma guitarra Gibson Flying-V.

Outro detalhe que funciona a favor do impacto que o filme de Byrne deixa no espectador é a sua duração. Os econômicos 79 minutos passam voando, em uma trama que oferece poucos momentos de relaxamento. Em 2015, The Devil’s Candy foi exibido em festivais como uma obra de 90 minutos, mas foi encurtado em 20 minutos para o lançamento nos cinemas. A mudança, mesmo para quem não viu o corte mais longo da produção, deixa a impressão de ter sido benéfica, em parte porque honra o Thrash Metal implacável (Metallica, Slayer, Cavalera Conspiracy) que não para de ecoar enquanto a trama se desenvolve.

Alguns espectadores, principalmente os que assistiram a Entes Queridos, podem sentir falta do gore que marcou o primeiro trabalho Sean Byrne. De fato, The Devil’s Candy não possui uma carga muito pesada de violência gráfica (com exceção do catártico embate final), mas não deixa de ser perturbador a seu modo, quando Byrne deixa de enfocar membros decepados em seu segundo longa, e resolve apostar na visão de que, independente da veracidade das vozes ouvidas pelos moradores da casa, o Mal de verdade habita no coração e na cabeça do Homem. Não há brutalidade cinematográfica que deixe marca maior do que o olhar final de Jesse diante de tanta selvageria.

The Devil’s Candy, Sean Byrne, 2017 ½

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