Sunday, July 21, 2013

Godzilla


Mais do que o fato de ter sido o filme mais caro da história do cinema japonês à época de seu lançamento ou ter dado origem a uma franquia de aproximadamente trinta filmes até hoje, Godzilla, de 1954, merece ser lembrado por sua coragem. 2 anos após o fim da ocupação do Japão pelas tropas Aliadas, lideradas pelos Estados Unidos, tempo durante o qual não se podia falar sobre os estragos físicos e psicológicos causados ao povo japonês pelos atentados às cidades de Hiroshima e Nagasaki, o filme de Ishirô Honda foi uma das primeiras obras artísticas a se propor a tratar de um tema tão doloroso: a herança da Bomba.
                                                  
Escrita por Honda e Takeo Murata, a história do monstro gigante que surge nas águas do Pacífico (em cenas antológicas, vale apontar) possui muito mais camadas do que aparenta no início, quando a criatura é a responsável pelo naufrágio de alguns navios e alarma, a princípio, um pequeno vilarejo à beira-mar. Logo somos apresentados a personagens e detalhes que aproximam a trama dos ataques atômicos direcionados ao Japão nove anos antes e revivem um pesadelo recente. Gojira teria sido despertado por testes nucleares feitos em águas japonesas, se tornando retrato (e, para nós, metáfora) das consequências da II Guerra Mundial e da Guerra Fria, que começava a ferver na época.

Entre esses personagens que surgem com importância para o desenrolar da narrativa está o cientista Serizawa, que começa tímido, em pouquíssimas aparições, mas que ganha destaque conforme o monstro se aproxima (e invade) a cidade de Tóquio, causando destruição e terror por onde passa. Serizawa sabe que sua invenção, o destruidor de oxigênio, pode ser a salvação, mas o que será da humanidade se ela cair nas mãos erradas? O que será do mundo com uma arma tão ou mais poderosa que a Bomba de Hidrogênio?

A direção de Ishirô Honda é genial, com o cineasta tendo compreendido, desde o início, que Godzilla era um exorcismo para seu país. Todos os detalhes contribuem para o sucesso da discussão. A trilha sonora quase militar de Akira Ifukube dá o tom de urgência e desespero, enquanto os brilhantes efeitos visuais retratam toda as arrasadoras aparições do monstro, que possui um design criativo (com seus espetos que se acendem quando a criatura cospe fogo) e uma realização que se tornaria molde para todos os Kaiju que vieram depois.

Honda não se priva de exibir seu demônio desde os primeiros minutos de Godzilla. Entende que para o exorcismo ser completo é necessário mostrá-lo, tal qual o rastro de tristeza e dor causado por ele. As imagens de pessoas correndo desesperadas e o som dos boletins de rádio que informam com detalhes a devastação embrulham o estômago, ao mesmo tempo em que fazem pensar sobre assuntos que nunca deveriam ser postos de lado. Obra-prima.

Godzilla, Ishirô Honda, 1954 

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