Ao
lado do bom telefilme A Garota,
sobre a péssima experiência de Tippi Hedren nas mãos de Hitchcock, Lovelace figura em um nicho altruísta das
cinebiografias, transformando o longa sobre Linda Lovelace, estrela do clássico
pornô Garganta Profunda e uma das mais
célebres pornstars de todos os tempos, em uma forma de fazer justiça com a câmera.
É difícil dizer se os diretores Rob Epstein e Jeffrey Friedman quiseram fazer
de seu filme apenas um pedido de desculpas de 90 minutos, mas ao fim da
projeção, e pela estratégia adotada em seu terceiro ato, essa é a única
impressão que fica.
Escrita
por Andy Bellin, a trama aborda a juventude de Linda (Amanda Seyfried), Boreman
no início, de forma extremamente didática e econômica, mostrando em alguns
minutos o fim da adolescência da protagonista e seu relacionamento com Chuck
Traynor (Peter Sarsgaard), que viria a ser seu marido e responsável por sua
entrada no mundo da pornografia. Após apresentar Linda ao público, a narrativa
salta para o envolvimento de Linda, agora Lovelace, com a feitura de Garganta Profunda, filme do qual foi estrela,
e aos poucos alguns segredos de sua vida ao lado de Chuck, que se revela um
crápula, são revelados.
Com
recriação de época cuidadosa, méritos para o design de produção de Willian
Arnold e os figurinos de Karyn Wagner, Lovelace
ganha muitos pontos por despertar credibilidade, já que a narrativa exageradamente
episódica (possuindo inclusive letreiros que exibe constantes saltos envolvendo
o número “6”, “6 meses depois”, “6 anos depois”), dá uma cara de telefilme malcuidado
que vai de encontro às pretensões de Epstein e Friedman. Essa natureza
episódica acaba comprometendo o resultado, pois impede que o espectador tenha
tempo de se envolver com os diversos momentos de Linda retratados na tela.
Acontece sempre da mesma forma: quando o namoro de Linda com Chuck começa a
engrenar, a narrativa salta, quando Lovelace
começa a retratar o sucesso e a influência cultural de Garganta Profunda, a narrativa salta, e é assim até o fim.
Os
modos como os diretores, auxiliados pelos montadores Robert Dalva e Matt Landon,
lidaram com o didatismo do texto não afetam, contudo, o bom elenco. Amanda
Seyfried é uma Linda Lovelace não necessariamente real, frequentemente
idealizada, mas surpreendente. Peter Sarsgaard consegue dar estofo a Chuck, utilizando
seu ar de bom moço para chocar ainda mais o espectador nas cenas em que ele “vende”
Lovelace. Além das curtas, mas ótimas participações de Sharon Stone, como a mãe
de Linda, e Hank Azaria, responsável por um dos momentos mais inspirados do
longa, no qual ele diz que uma atriz pornô sem bunda e peito é como “um filme
de guerra sem lutas”.
E
dessa forma conflitante (bom elenco, narrativa capenga; tecnicamente interessante,
mas com um texto problemático) caminha Lovelace,
até o momento em que a trama entra na reta final. Seus últimos 40 minutos
acabam sendo o momento mais discutível da produção. E se digo discutível, e não
exatamente que o terceiro ato é problemático ou ruim é porque, de fato, diferentes
opiniões podem surgir. Mas é curioso como apenas em sua reta final Rob Epstein
e Jeffrey Friedman resolvem dar voz ao texto de Bellin na vitimização de Linda,
transformando Chuck em um monstro e a trajetória da protagonista dentro do
mercado pornô em um pesadelo. Os cineastas optaram pela narrativa linear,
comportada, e não se debruçaram muito sobre as dificuldades de Linda (apesar de
insinuar durante alguns momentos que Garganta
Profunda era uma experiência pouco agradável para ela) até a sua reta
final, quando resolvem jogar todo o sofrimento da personagem de Seyfried nas
telas.
E
quando rompe o véu de fantasia e resolve mostrar a ”verdade”, Lovelace revela suas reais intenções,
goste-se ou não: pedir desculpas pelo esquecimento, e fazer justiça à
importância de uma mulher que sofreu demais, mas, mesmo sem ter muita noção,
mesmo tendo feito filmes contra sua vontade, foi uma das vozes femininas mais
fortes de seu tempo e um dos símbolos da revolução sexual dos anos 70.
Lovelace, Rob Epstein e Jeffrey Friedman, 2013 

1 comment:
acho uma biografia um tanto convencional, estilo Jonhy e June, Cazuza, Ray e o que define gostar ou não é o quanto a trajetória do personagem te envolve e da atuação do ator/atriz principal
dito isso, eu gosto desse filme.
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