Thursday, October 24, 2013

Os Suspeitos

Ao longo de seus 146 minutos, Os Suspeitos é uma experiência angustiante. Algumas vezes comparado aos thrillers de David Fincher, a estreia do diretor Denis Villeneuve nos EUA se aproveita das paisagens geladas do inverno de Boston e da estrutura narrativa baseada em investigações que revelam novos detalhes a cada momento e afundam os homens envolvidos em uma espiral de paranoia interminável para criar um longa tenso, cheio de nuances sobre os personagens, e absolutamente perturbador.

Escrita por Aaron Guzikowski, a trama acompanha as investigações policiais e o tormento das famílias das jovens meninas Anna e Joy (as lindinhas Erin Gerasimovich e Kyla Drew Simmons, respectivamente), desaparecidas enquanto os pais das crianças preparavam o jantar de Ação de Graças. Desesperado e cansado da falta de notícias e soluções por parte da polícia local, Keller Dover (Hugh Jackman), pai de Anna, resolve buscar respostas que o ajudem a encontrar sua filha. Para isso, sequestra Alex Jones (Paul Dano), principal suspeito do crime e libertado da prisão por falta de provas, a fim de obrigá-lo a entregar o local para onde as duas pequenas foram levadas.

Extremamente bem escrito, o roteiro dá conta de uma narrativa dividida em duas linhas que caminham lado a lado e se entrelaçam o tempo todo. Loki, o detetive vivido por Jake Gyllenhaal, nunca consegue se desvencilhar de Keller e sua obsessão em achar sua filha. Para que as reviravoltas, as nuances da trama e o estudo de personagens levados ao limite funcionem bem, o roteirista recebe auxílio da direção de arte primorosa, que encontra ecos em Millenium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres e Inverno da Alma, da edição habilidosa de Joel Cox e Gary Roach, colaboradores frequentes de Clint Eastwood, e de um diretor muito mais do que seguro.

Villeneuve, sutil ao conectar o fim de uma cena ao início da seguinte (como no momento em que ele mostra Loki empurrando uma van de brinquedo sobre uma mesa para, na sequencia, abrir a próxima cena com uma van batida em uma árvore) mostra competência ímpar para ilustrar as cenas e exibir, não só no raccord, mas com suas composições, traços reveladores de Os Suspeitos (cujo nome original, Prisoners, “prisioneiros” em Português, é lindo por ser tão apropriado). Um desses traços, latente desde o início da projeção, é a forte ligação religiosa que une os personagens. O cineasta é inteligente ao, sem contar com cenas em igrejas ou com cerimônias de qualquer tipo, exibir para o espectador a religiosidade presente no texto de Guzikowski, no “Pai Nosso” que inunda nossos ouvidos antes que qualquer imagem seja mostrada e no close rápido da cruz tatuada na mão de Loki.

O comandante mostra entender também da condução dos atores. Nas mãos de Villeneuve, o elenco (que além dos já citados, conta também com nomes como Viola Davis, Maria Bello e Terrence Howard) se comporta de forma completamente harmônica com o tom de agonia crescente desejado pelo diretor. Nesse mosaico de boas atuações, o destaque acaba ficando para Hugh Jackman e Jake Gyllenhaal, dividindo a tela em diversos momentos, sempre com muita intensidade. Ótimo para um filme que depende muito de seus atores para que sua carga dramática convença e funcione para o espectador.

Como dito no início desse texto, Os Suspeitos tem sido constantemente comparado a trabalhos como Seven e Zodíaco, ambos dirigidos por David Fincher. Observando a proposta narrativa das obras, é fácil entendermos o porquê de tais referencias. Tanto os suspenses de Fincher quanto o longa de Villeneuve apostam na decisão de usar investigações criminais para estudarem os efeitos da obsessão e da paranoia nos homens. Loki e Keller não são muito diferentes de Sommerset e Mills, ou de Robert Graysmith e Paul Avery. Todos eles sacrificam sua saúde mental a fim de solucionarem o quebra-cabeça que os atormenta. É claro que em Os Suspeitos existe o adicional do laço de sangue que une Keller e Anna, mas no fim das contas, todos os três contos de horror acabam fazendo o mesmo por seus personagens: levando-os (às vezes literalmente) para o buraco, de onde nem sempre é possível sair.

Prisoners, Denis Villeneuve, 2013 

1 comment:

joao said...

acho bem melhor que seven e zodiado(que pretendo rever). mas tem estilo parecido mesmo.

belo filme