Saturday, December 07, 2013

Carrie, A Estranha

Refilmar um clássico do terror é uma aposta no mínimo arriscada, devido aos diversos resultados que podem ocorrer. Corre-se o risco de arrumar problemas com os fãs mais radicais, afastar o público jovem do longa mais antigo além de, na pior das hipóteses, diminuir o impacto da obra original.

O novo Carrie, A Estranha não chega a ser ruim a ponto de comprometer o maravilhoso filme que lhe deu origem, mas também fica muito longe de ser aceitável. Lançado em 76, o primeiro Carrie era um achado, contando com um roteiro que eliminava a gordura do romance de Stephen King, sua porção investigativa, e com a direção de Brian De Palma para ser um conto de horror sobre o desabrochar de uma mulher, seus ritos de passagem e sua confusão mental que quase definiu uma geração.

Sua versão mais nova, no entanto acaba empacando. Parece que sobrou reverência à diretora Kimberly Peirce (repare nos créditos iniciais e em como a direção de arte emula a década de setenta nos cenários e veículos), mas acabou lhe faltando compreensão acerca do material que tinha nas mãos. A história é igual e se desenrola quase da mesma forma: Carrie contraria sua mãe, vai ao baile de formatura e acaba tendo a pior noite de sua vida, amadurecendo da forma mais amarga.

Desde o início, porém, o projeto já parecia fadado ao fracasso. A escolha do elenco já dava indícios da ausência de entendimento acerca da narrativa por parte dos envolvidos na produção da empreitada. Chloë Grace Moretz, apesar de todo o potencial que possui, nunca seria uma boa Carrie. Após cenas pouco inocentes em Sombras da Noite e Em Busca de um Assassino, e ser vista dilacerando adultos em Deixe-me Entrar e Kick-Ass, Moretz simplesmente não consegue emular metade do ar de inocência que Sissy Spacek possuía no longa de De Palma. Tudo que ela faz, apesar do esforço da atriz, parece falso, fingido.

Outro indício de que não se tinha muita noção do que fazer com a trama é a atenção que a narrativa dá para a descoberta que Carrie faz de seus poderes. Ela os estuda demais e aprende a manipulá-los de tal forma que dá a impressão de que Carrie estava aprendendo a se defender, o que diminui e muito o impacto de suas ações no terceiro ato. O texto de Roberto Aguirre-Sacasa, talvez por sua experiência na série de TV Glee, transforma Carrie, A Estranha em um filme sobre vinganças de adolescentes. A vilã unidimensional, uma vagabunda, se vinga de Carrie e ela, atormentada, tem sua revanche na recriação da clássica cena do massacre no baile de formatura, mal filmada em uma profusão inexplicável de câmeras-lentas.

Chris, a tal vilã, grande responsável pelo misto de intolerância, pena e ódio coletivo da escola pela protagonista, é a personagem que mais sofre com essa nova adaptação comandada por Peirce. Antes uma mulher forte, além de muito mais experiente que sua maior inimiga, que faz uso de seu poder de sedução para persuadir seu namorado a ajudá-la em sua vendeta, ela foi reduzida a um rascunho, uma massa facilmente manipulada pelo seu macho, que articula todo o plano. E o mais decepcionante é ver que a cineasta tem lampejos de criatividade em algumas cenas, como à qual Carrie vê sua mãe (interpretada no modo-imitação por Julianne Moore) se aproximando de forma distorcida através do vidro, mas esbarra em sua filosofia e seu sexismo, que também se revela em uma cena em que, após descobrir como controlar sua telecinese, Carrie entra no banheiro toda descabelada e sai com as madeixas muito bem escovadas, em uma metáfora muito mais do que óbvia.

É a Crepuscularização do cinema, era de algumas mulheres que realizam obras sobre o universo feminino, mas que acabam sendo extremamente machistas na maneira como suas personagens encaram o sexo e suas relações com os homens.

Carrie, Kimberly Peirce, 2013 ½

2 comments:

joao said...

achei o filme ok. o maior problema foi Chloë Grace Moretz, que não convence como carrie.é dificil acreditar que ela seria a garota vitima das outras. precisava no minimo de muita maquiagem pra deixa-la estranha, ou outra atriz

Raquel Raposo said...

Eu achei o filme legal.
Não posso nem compara o primeiro com esse por ainda não ter visto. Mas fiquei curiosa agora.