Wednesday, February 26, 2014

Philomena

Ao longo de seus 98 minutos, Philomena se revela uma experiência decepcionante. Apesar de contar com ótimos ingredientes, como um bom elenco, um diretor interessantíssimo e uma história que possuía linhas gerais tão inacreditáveis que só podiam ser verdade, o longa parece se perder a partir do momento em que permite que seu roteiro invista em um maniqueísmo perigoso e destrua justamente o que deveria ser sua maior virtude, o seu caráter crítico.

A história era cinematográfica por natureza: em 1952, a irlandesa Philomena Lee foi separada de seu filho Anthony, ainda um bebê, que foi dado para adoção pelas freiras do convento em que a jovem mãe vivia e trabalhava forçosamente. Cinco décadas depois, Philomena resolve partir para os EUA em uma busca pelo paradeiro de Anthony, sendo acompanhada pelo jornalista Martin Sixmith que, após perder seu antigo emprego, resolve investir em “histórias de caráter humano” escrevendo sobre o caso.

Philomena é um filme que se escora na figura feminina, dentro e fora da narrativa. Judi Dench brilha como a protagonista, que é uma personagem fascinante em sua simplicidade e que conquista simpatia e respeito por sua tridimensionalidade, muito bem retratada pelo roteiro de Jeff Pope e Steve Coogan, que interpreta Sixmith. A fé quase inabalável da mulher, que acredita e confia em Deus mesmo após ter sido traída por servas Dele é fascinante, e enriquecida por sua interação com o cético jornalista. Nas mãos de Stephen Frears, um cineasta cujo rigor e forma se apoiam geralmente no retrato da humanidade dos homens e mulheres nas histórias que encena, Philomena e Martin ganham contornos de veracidade cruciais para o envolvimento do espectador.

Infelizmente, o mesmo roteiro que acerta ao apostar todas as suas fichas em seus personagens centrais acaba cometendo deslizes que comprometem e muito o resultado final. As alterações nos acontecimentos reais não representaria maiores problemas se, por exemplo, condensar as muitas viagens de Philomena aos Estados Unidos em apenas uma não acabasse por forçar a protagonista a fazer todas as descobertas (e são muitas) acerca do seu filho em um espaço de dois ou três dias, transformando a ida da mulher à América em uma grande epifania.

O maior problema do texto de Pope e Coogan e da direção de Frears, no entanto, é abraçar sem nenhum pudor o caminho mais fácil, fazendo do belo caso de Philomena uma luta do bem contra o mal, sendo esse um mal concreto, com grades, portões de ferro e freiras malvadas. Philomena possui uma realização maniqueísta ao extremo, com direito a lições de moral e ensinamentos sobre valores cristãos que impedem o espectador de tirar suas próprias conclusões acerca da fé da protagonista e da falta dela por parte de seu amigo repórter. Se um dos dois é muito mais feliz, seríamos tolos se não pensássemos da mesma forma.

Philomena, Stephen Frears, 2013 ½

2 comments:

joao said...

otimo texto. gosto do filme. acho leve, divertido e bonito. nada demais. e esses problemas nao me incomodaram

joao said...

otimo texto. gosto do filme. acho leve, divertido e bonito. nada demais. e esses problemas nao me incomodaram