Existe um grande obstáculo ao se adaptar
as aventuras do Capitão América para as telas em pleno Século 21 e tentar
vende-las para públicos para além da fronteira dos Estados Unidos. Tal
dificuldade é gerada justamente por aquela que é a característica mais marcante
da personalidade de Steve Rogers, e por consequência, sua essência enquanto
personagem. Criado com a intenção de ser reconhecido como símbolo do patriotismo
norte-americano durante a Segunda Guerra (o primeiro gibi do herói data de
1941), o Sentinela da Liberdade, aquele que veste a bandeira dos EUA, representa
ideais ufanistas antigos e ultrapassados.
Lançado em 2011, Capitão América: O Primeiro Vingador escapou da armadilha
justamente por ser um filme de origem. Dirigido por Joe Johnston, o longa se
passava nos anos 40 e tinha como sua maior qualidade justamente o fato de
exibir, antes de o Capitão partir para viver sua aventura, sua imagem como
estímulo para os soldados nos campos de batalha contra o nazismo. Trata-se de
um filme ambientado em um universo bem mais inocente, como o próprio perfil do
herói, do que os tempos atuais e talvez por isso mesmo (aliado, logicamente, ao
inegável talento de Johnston para conduzir a narrativa por esse viés) seja tão eficiente.
O
Soldado Invernal, sua sequência, não pode se dar ao luxo
de alinhar sua premissa ao perfil dos primórdios do Supersoldado, mas nem por
isso deixa de encontrar um caminho vitorioso para sua narrativa. A trama,
escrita por Christopher Markus e Stephen McFeely (responsáveis pelos textos de O Primeiro Vingador e do ótimo Thor: O Mundo Sombrio) resolvem o
impasse acerca dos rumos da história escolhendo o caminho mais lógico: o
Capitão América não tem espaço no mundo de hoje.
Esse argumento consegue a proeza de
retirar a sisudez (a cena em que Rogers conversa sobre suas experiências com
Natasha, a Viúva Negra, no carro é um primor) ao mesmo tempo em que confere ao
filme um senso de unidade, fazendo com que tanto as digressões (a melhor delas,
o caderninho no qual Steve anota os ícones da cultura pop que não acompanhou
durante o tempo em que ficou congelado) quanto a trama principal girem em torno
do mesmo tema.
Com isso, o mote da inadequação da
figura do líder dos Vingadores nos dias atuais acaba gerando em Capitão América 2 um tom de filme de
espionagem setentista, opção narrativa (e estética, vale apontar) do roteiro e
dos diretores Anthony e Joe Russo endossada pela presença de Robert Redford, um
dos símbolos dos filmes de conspiração, no elenco. Redford, em um papel
fundamental dentro da trama, acaba por dar estofo a um longa que já mereceria
aplausos por cenas como a que Nick Fury explica um projeto ultrassecreto para o
Capitão que, em seus conceitos morais inabaláveis, recebe tudo como uma afronta
aos direitos de liberdade dos cidadãos.
Os outros personagens que pintam com
destaque na tela acabam por reforçar a ideia de que O Soldado Invernal é um longa sobre não pertencer a lugar algum,
mas também fazem com que a expansão do universo da Marvel no cinema seja
percebida de forma latente. O Falcão de Anthony Mackie, estreante na franquia,
e a Viúva Negra, braços direitos do protagonista, o conectam com o presente
enquanto Fury e a cara nova (pelo menos para os não-iniciados) do longa, o próprio
Soldado Invernal que nomeia a fita, são elos com o passado de Steve e suas
memórias mais antigas, que o levam a investiga-las (o que leva a uma
participação divertidíssima de Toby Jones) para entender o clima de traição que
o cerca agora.
O Capitão América pode ainda estar se
sentindo um perdido em sua nova realidade, mas suas aventuras já encontraram o
seu lugar e o caminho que as levam direto ao coração dos fãs.
Captain America: The Winter Soldier, Anthony & Joe Russo, 2014 

1 comment:
Achei o filme excelente!
Ótimo texto.
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