Dom
Hemingway é um sujeito apaixonado por si próprio. Desde o início, desde que
abre a boca pela primeira vez, em um solilóquio sobre os poderes de sua genitália
(cuja imponência poderia, entre outras coisas, acabar com a fome na África), o
espectador percebe que a) Dom é um crápula egoísta, mas fascinante enquanto
personagem e que b) A Recompensa é
uma péssima tradução, sem o menor charme do original, que era coerente com a
autoafirmação e a crença do protagonista na mitificação a fórceps de seu nome.
Na
trama, escrita e dirigida por Richard Sheppard, Dom Hemingway é um talentoso
arrombador de cofres que passa 12 anos na cadeia após se recusar a entregar seu
empregador para a justiça, o que reduziria bastante pena. Após ser libertado
Dom, acompanhado pelo amigo Dickie, vai atrás do mafioso Sr. Fontaine a fim de receber
sua recompensa por ter ficado de boca fechada. O problema é que o azar, aliado
a um comportamento que o afastou da filha, que se recusa a fazer as pazes,
fazem a felicidade ficar cada vez mais distante do anti-herói.
Sheppard
embebe seu filme do tom das comédias criminais britânicas. Dá a A Recompensa
uma estética que se assemelha aos primeiros filmes de Guy Ritchie, e se destaca
por elaborar cenas de humor físico hilárias como o momento em que Dom tenta
vencer um moderno cofre, a fim de provar que pode trabalhar para o jovem Lestor
Jr. Por ser também autor do roteiro, o cineasta merece aplausos por ser
coerente ao conceber visualmente o texto quase tresloucado, e por ter escolhido
a dedo Jude Law encarnar o protagonista.
Idealizado
com um cruzamento de Begby, de Trainspotting
e Bronson de, bem. Bronson, Dom
contrasta radicalmente com os protagonistas do galã. Talvez venha daí essa
motivação, venha todo o frescor de sua ótima atuação, principalmente na
primeira hora de projeção. Em sua reta final, porém, A Recompensa acaba tendo que resolver a subtrama da reconciliação
entre o protagonista e a filha (e também com seu passado), um direcionamento da
narrativa que buscava humanizar o personagem, mas que retira dele seu ar de
alucinado, de longe sua característica mais marcante.
Uma
pitada de pé no chão, que quebra o ritmo e abala, apesar de não estragar, a
bela comédia de humor negro que se via até então. Um pouco de realismo não faz
mal, mas eu preferia continuar vendo Dom naquele mundo de prisões de paredes
coloridas e homens que, mesmo com um para-choque atravessado no abdômen,
conseguem achar um tempo para baterem um papinho antes de morrerem de vez.
Dom Hemingway,
Richard Sheppard, 2013 

No comments:
Post a Comment