Sunday, June 01, 2014

No Limite do Amanhã

Apesar de se tratar da adaptação de um romance, No Limite do Amanhã, de Doug Liman (diretor de trabalhos eficientes, e profissional muitas vezes subestimado) talvez seja o filme que melhor imita, em sua estética de repetição, o espírito dos videogames, principalmente os clássicos da era dos 8 e 16-bits, época de jogos tão difíceis que os gamers apenas aprendiam como passar de certas fases após morrerem incontáveis vezes e memorizarem os desafios.

Mais surpreendente ainda é o tom de sátira política do texto de Christopher McQuarrie e os irmãos Jez e John-Henry Butterworth, principalmente em sua primeira metade, e como a história vai se transformando aos poucos em uma reflexão sobre a guerra. A trama, ambientada em um futuro não muito distante, acompanha uma invasão alienígena à Terra, combatida sem sucesso pelos exércitos dos países ao redor do mundo.

Quando o major Bill Cage (Tom Cruise), assessor de imprensa responsável por promover a guerra e que nunca esteve na linha de frente de combate algum, é convocado a registrar ao vivo a batalha que se dará na França, ele tenta chantagear o general (Brendan Gleeson) responsável pela convocação, é acusado de deserção e posto na posição de soldado no pelotão do sargento Farell (Bill Paxton). Em cinco minutos de combate na Normandia, Cage acaba morrendo ao conseguir explodir um alienígena, mas desenvolve o poder de voltar no tempo e viver aquele dia novamente, contando com a ajuda da veterana Rita (Emily Blunt), que o treina e o convence da possibilidade da vitória.

Agora, toda vez que morre, Cage acorda no batalhão e tem a chance de batalhar de novo uma versão futurista do “Dia D”. A essa premissa, soma-se um bem resolvido paralelismo com a Segunda Guerra (a importância do território francês, o próprio Dia D) que dá a No Limite do Amanhã uma esperteza aliada à diversão descomprometida que faz falta aos blockbusters de hoje em dia. Ao acionar seu botão de Continue, Cage reencontra a batalha (uma versão futurística da sequência de abertura de O Resgate do Soldado Ryan) sem que nada esteja diferente. Nessa hora, Liman e seus roteiristas parecem perguntar: são os filmes de guerra, ou as guerras em si, que são todas iguais?

Além de emular os games em sua estética, e de mesclar filmes tão distintos como Feitiço do Tempo e Tropas Estelares no desenvolvimento de sua trama, o longa surge como um dos longas mais originais do ano justamente por ainda conseguir fundir outros filmes através do desenvolvimento dos personagens (os ares Ripley de Rita, o canalha transformado em herói como em Distrito 9) e da concepção visual dos soldados (exoesqueletos que lembram Matrix Revolutions, Blunt carregando uma espada gigante que se assemelha ao RPG Final Fantasy), que transforma a experiência de assistir ao sci-fi de Doug Liman também em um exercício de reconhecimento de referências.

E mesmo que não consiga manter o tom satírico (como Verhoeven fez mais incisivamente no já citado Tropas Estelares) ou investir em um desfecho mais corajoso (o romance mal-ajambrado que toma conta do terceiro ato quase compromete o que fora construído até então), No Limite do Amanhã é sim um belo sci-fi, politizado, contestador (sua inspiração na dinâmica dos jogos virtuais pode ser encarado como uma crítica às guerras de hoje em dia, feitas com drones controlados por computadores e joysticks) e que, no caminho, ainda consegue ser extremamente empolgante. Não é todo dia que se vê algo assim.

Edge of Tomorrow, Doug Liman, 2014 ½

1 comment:

joão said...

não me chamou atenção. um filem de guerra que me lembra contra o tempo é algo que definitivamente não me anima, mas quem sabe