Saturday, June 13, 2015

Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros

Entender seu papel como mercadoria e não se levar a sério em sua função de ser parte reboot, parte sequencia é o que faz de Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros um passatempo quase irresistível. Dotado de um tom quase solene quando se refere ao Parque dos Dinossauros original, e recheado de referências a clássicos do cinema que foram precursores do filme dirigido por Steven Spielberg em 1993, o quarto longa da franquia não tem vergonha de imprimir um ritmo de ação quase ininterrupta, o que maquia e quase faz desaparecer os problemas ideológicos da obra, como um machismo nada velado e a mudança de tom no terceiro ato, que passa da luta pela sobrevivência, que sempre marcou a franquia, para uma dinâmica de combate que incomoda qualquer um que seja contra a caça a animais selvagens.

A trama, que Colin Trevorrow dirige a partir de um roteiro escrito por ele em parceira com Rick Jaffa, Amanda Silver e Derek Connolly, parte de uma premissa não muito lógica se considerados todos os acontecimentos do primeiro filme, mas que parece extremamente coerente com o universo da série: batizado como Jurassic World, o parque dos dinossauros, menina dos olhos do magnata John Hammond, está em pleno funcionamento, e recebe milhares de visitantes por dia em sua estrutura que possui semelhanças com o Sea World. As mudanças em relação ao parque projetado inicialmente se dão por fruto dos novos tempos. É preciso sempre trazer novas atrações, e os cientistas da Ilha Nublar agem nesse sentido criando dinossauros híbridos, maiores e mais violentos (“Precisamos de mais dentes” é uma frase repetida por diversas vezes, em contextos diferentes), para que o público esteja sempre ansiosa por ver as criaturas.

A modernização dos dinossauros é uma atualização na trama, mas apenas em partes, pois apesar de diferenciá-la das três aventuras anteriores, ela serve mesmo é para que a narrativa revisite as críticas, presentes em seus irmãos mais velhos, à mania que o homem tem de brincar de Deus. À falta de originalidade do roteiro ao alfinetar a genética soma-se o retorno a praticamente todos os estereótipos que em 93 foram encarnados por Sam Neill, Laura Dern, Jeff Golblum e cia. Não escapa quase nada: estão lá as crianças (Zach e Gray, vividos por Nick Robinson e Ty Simpkins) que se perdem na ilha e precisam ser resgatadas, e o casal principal, que repete a figura masculina, agora chamada Owen (Chris Pratt), e faz mudanças na personagem feminina, agora Claire (Bryce Dallas Howard), tia de Zach e Gray, uma executiva viciada em trabalho que não tem tempo nem paciência para a família.

Nessa dinâmica reside o maior trunfo de Jurassic World. Ao apostar nas personas mais clássicas da franquia, mas colocá-las perante novos vilões (o inescrupuloso Hoskins de Vincent D’Onofrio, que sonha em utilizar Velociraptors treinados como armas de guerra, mas que jamais conta com o consentimento de Owen) e desafios literalmente maiores (e bem convincentes em suas toneladas de CGI) e mais inteligentes, Colin Trevorrow e seus roteiristas ficam no meio-termo entre a continuação e a refilmagem, ganhando o espectador pela memória afetiva (impossível não associar os olhares maravilhados de Zach e Gray ao dos personagens de Parque dos Dinossauros quando chegavam à ilha), reverenciando, com cenários do primeiro filme, inclusive, e exibindo um monte de referências, de Aliens: O Resgate a Godzilla (a minha preferida é o ataque dos Pterodáctilos, uma homenagem rasgada a Os Pássaros).

Incomoda bastante, no entanto, o tratamento dado aos dinossauros, sejam Pterodáctilos ou o híbrido Indominus Rex, vilanizados de vez. Apesar da vontade de se assumir como mezzo remake, Jurassic World não consegue em momento algum que o espectador relativize o que está acontecendo na tela, pois apesar do personagem de Jake Johnson e suas discussões sobre ética com o empresário Simon Masrani (Irrfan Khan), fica difícil pensar no assunto no meio de tiroteios, explosões e militares correndo pra lá e pra cá, descaracterizando todo um contexto estabelecido há mais de 20 anos.

O problema é que, mesmo revisitando a trama e parte da dinâmica entre os personagens de outrora, Trevorrow não é Spielberg, que havia sido bem-sucedido ao levar o romance de Michael Crichton para a película, em uma obra coesa e bem-resolvida tematica e ideologicamente, e que ainda por cima limava das telas um certo sexismo que poderia vir à tona, até pela natureza aventureira da narrativa (que remetia à época dos heróis destemidos, até no modo do protagonista vivido por Sam Neill se vestir), e que seria menos contestado no início dos anos 90 do que hoje em dia. O Mundo dos Dinossauros se complica todo no modo como desenha seus personagens, na misoginia descabida de Owen, e especialmente na jornada de Claire, que passa por uma transformação decepcionante (para dizer o mínimo) durante a projeção, indo da mulher independente à condição de donzela.  Ela até se defende sozinha, com uma camiseta apertada que revela suas curvas (alguém lembra de Chamada de Emergência?) e correndo muito calçando sapatos de salto bem alto, mas se sente muito mais protegida ao lado do macho, que chega ao cúmulo de se auto-intitular o “Alfa” em certo momento.

Bateu até certa culpa por ter me divertido até ali.

Jurassic World, Colin Trevorrow, 2015 

2 comments:

Raquel Raposo said...

Gostei muito do filme!
Bem divertido, e a cena final da luta do T-rex com o Indominus é muito legal!

joao said...

gostei do filme. E não acho que seja machismo.Não creio que ter uma mulher "donzela" torne a personagem machista.