Apesar
dos dois últimos filmes de Antoine Fuqua serem veículos de promoção para os
atores que interpretam os protagonistas, existe uma diferença clara na
abordagem que o diretor faz de seus astros nos dois trabalhos. Pois, se a
intenção de O Protetor era enxergar
em Denzel Washington um dos maiores intérpretes de sua geração, buscando a todo
o momento mitificar a sua imagem, em Nocaute
o plano é conseguir o reconhecimento acadêmico para o talento de Jake
Gyllenhaal, que nos anos mais recentes tem buscado com afinco sua estatueta.
Inegavelmente,
o ator é a força-motriz por trás da trama que acompanha o boxeador Billy Hope,
que tenta reconquistar a tranquilidade (financeira, familiar, de espírito) após
a paz lhe ser arrancada com um tiro de revólver. A tentativa de voltar aos
trilhos passa por fazer as pazes com a filha Leila (Oona Laurence) e, com o
auxílio de um novo treinador (Forest Whitaker), lutar mais uma vez pelo
cinturão dos pesos meio-pesados.
É
poderosa a atuação de Jake Gyllenhaal, que vai do intenso (beirando a
caricatura) ao contido sem medo. Pois Billy Hope é a imprevisibilidade em
pessoa, e seus arroubos de fúria, que remetem imediatamente a Jake LaMotta
(papel do boxeador que, curiosamente, deu a Robert De Niro seu único Oscar de
Melhor Ator por Touro Indomável),
combinam-se com sua postura de pai amoroso e ajudam a formar a imagem de um
protagonista quase fascinante. E a intensidade de Gyllenhaal, seja sobre o
ringue, local onde, durante a primeira metade da narrativa, Billy expurga sua
dor ao oferecer seu corpo como saco de pancadas aos adversários (postura que
novamente o aproxima de LaMotta), seja nas visitas à filha, dá o tom do longa,
que por diversas vezes, quase chega a transcender o óbvio.
E se não consegue, é porque o roteiro de Kurt Sutter, de Sons of Anarchy, em momento algum chega a atingir um nível mínimo
de originalidade, em seus desenhos de personagens (a esposa preocupada, o
empresário inescrupuloso, o boxeador inimigo com suas provocações, o
treinador que inicialmente se recusa a trabalhar com o protagonista) e trama
que nunca surpreendem. Pelo menos, é bem verdade que Nocaute faz parte de uma tradição que remonta a oitenta anos de
cinema, contados pelas lentes de Martin Ritt (diretor de A Grande Esperança Branca/The Great White Hope, obra que Fuqua homenageia, ao nomear seu protagonista e em uma cena em que o título daquele longa aparece como manchete de um jornal), Robert Wise, Raoul Walsh, John G. Avildsen, Martin Scorsese, e que
os filmes de protagonizados por lutadores são daqueles gêneros e subgêneros que se saem bem quando
entendem seus lugares-comuns como necessários para que o drama e a trajetória
daqueles homens, de párias a heróis de uma nação ou de suas famílias, sejam contados. E é
exatamente o que acontece aqui.
Pois
se o roteiro é recheado de clichês, de filmes de boxe e do cinema urbano com
questionamentos sociais de Fuqua (como a subtrama que envolve a família
desestruturada do menino Hoppy), que por sua vez não dirige com muita
propriedade, colecionando ângulos já vistos em dezenas de outros longas do tipo
e apostando em cortes excessivos nas cenas de luta, é inegável que Nocaute não se realiza como cinema de
qualidade quando se foca na pancadaria ao pôr seus adversários para resolverem
suas diferenças no braço. Coerente com os clichês que abraça, esse é daqueles longas de boxe que só se revelam no âmbito familiar, quando dá espaço para o talento de Jake
Gyllenhaal (que conta com o apoio de bons coadjuvantes como Rachel McAdams e 50
Cent, além de Whitaker e da lindinha e já citada Oona Laurence), e quando
coloca pai e filha para lutarem juntos pela reconstrução de suas vidas.
Southpaw,
Antoine Fuqua, 2015
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