2015
foi o ano em que, ainda mais do que nas últimas temporadas, o espectador se
deparou com uma avalanche de sequências/reboots/refilmagens de franquias
famosas a estrearem nos cinemas do mundo. Mad
Max, Jurassic Park, O Exterminador do Futuro, Poltergeist, Missão: Impossível, todos ganharam novos longas-metragens, mas,
apesar de serem representações de séries estabelecidas, seguiram caminhos
diferentes nas telas. Enquanto alguns se apresentaram como aventuras que moviam
a narrativa para um novo lugar, apresentando certas diferenças em relação aos
filmes anteriores (Mad Max: Estrada da
Fúria, Missão: Impossível – Nação
Secreta), outros se preocuparam muito mais em entregar ao público uma
coleção de fan services do que em movimentar suas tramas com alguma novidade (Jurassic World, Poltergeist, o horroroso O
Exterminador do Futuro: Gênesis).
É triste notar, portanto, que o novo James Bond faz muito mais parte do
segundo grupo. 007 Contra Spectre dá
ao fã vários momentos com os quais ele possa se identificar, mas falha em
encerrar satisfatoriamente o arco de filmes estrelados por Daniel Craig (que,
com sua intensidade, deu novos ânimos ao personagem) no papel principal. A
trama, escrita por John Logan, Neal Purvis, Robert Wade e Jez Butterworth, dá
sequência aos acontecimentos de 007 –
Operação Skyfall (2013), longa anterior do agente secreto. Bond vai ao
México realizar um trabalho sem o conhecimento do MI6 e, após a morte do
mafioso Marco Sciarra, acaba se deparando com uma organização criminosa, a
SPECTRE, presidida pelo sinistro Franz Oberhauser (Christoph Waltz).
Paralelamente,
uma batalha nos bastidores do Serviço Secreto Britânico é travada entre M
(Ralph Fiennes) e C (Andrew Scott), que tem planos de estabelecer uma Nova
Ordem Mundial baseada na vigilância constante (conceito levantado pela
literatura de George Orwell, que aqui é reverenciado em um diálogo rápido), e
planeja encerrar o Programa 00. Logicamente, James Bond não poderá resolver tudo
sozinho, contando com a ajuda de Moneypenny (Naomie Harris), Tanner (Rory
Kinnear), Q (Ben Wishaw) e do próprio M, que precisará mostrar sua eficiência
em campo, além de Madeleine Swann (Léa Seydoux), que por ser ligada a um
personagem importante de Cassino Royale
(2006) e Quantum of Solace (2008),
parte em sua própria jornada de revelações.
Sam
Mendes, o diretor de 007 Contra Spectre,
foi o responsável por levar às telas a trama que encerraria a sequência de
longas iniciada por 007 – Cassino Royale.
Essa é a sua segunda contribuição para a série, após o bilhão de bilheteria
conquistado por sua estreia no comando de 007
– Operação Skyfall. Apesar de o principal motivo para o retorno do diretor
à franquia ser o excelente resultado financeiro do filme anterior, existem
qualidades técnicas evidentes na direção de Mendes naquela obra, um filme que
apresentava plástica irrepreensível ao mesmo tempo em que estabelecia relações
interessantes do ofício de James Bond com seu passado, fazendo com que surpreendentemente
conhecêssemos mais uma faceta do protagonista, mesmo após 22 aventuras.
Desta
vez, no entanto a necessidade de criar um encerramento para a trajetória de
Craig como o protagonista faz com que a trama aposte na SPECTRE, a grande
organização que 007 combatia nos filmes clássicos da série, como uma espécie de
núcleo em torno do qual giravam todos os três longas que o precederam. E o
texto é problemático principalmente por isso: ao costurar uma conexão entre Le
Chiffre, Mr. White, Dominic Greene e Silva, 007 Contra Spectre comete o pecado de enfraquecer aqueles vilões,
que antes não aparentavam ser parte de um plano maior.
Parece
forçado o controle que Oberhauser tem sobre o MI6 e a vida de Bond. Em momento
algum acredita-se nas explicações que a narrativa dá para as perdas que o
agente teve nos episódios mais recentes, desenhando as motivações do grande
vilão da vez como ciumeira boba que se externou de maneira extrema. Christoph
Waltz compõe Oberhauser de maneira calculadamente calma e ameaçadora, não muito
diferente dos malvados que o ator interpretou em Bastardos Inglórios (Tarantino, 2009) e O Besouro Verde (Gondry, 2011), mas Oberhauser jamais soa ameaçador
como devido, representando uma ameaça bem menor do que Le Chiffre e Silva,
bandidos controlados por ele e que aparentavam ter motivações mais urgentes.
Isso
leva a uma outra digressão: existe menos gravidade na investigação de James Bond
em 007 Contra Spectre, e parte disso
se dá justamente na tendência que os últimos longas demonstraram em lançar mão
de acontecimentos que marcariam Bond para sempre no ocaso de
sequências de ação. Foi assim com as mortes de Vesper Lynd (Eva Green) e de M
(Judi Dench), por exemplo. Após estabelecer esse tom catártico da pancadaria nos
exemplares recentes, Spectre
parece se trair e enfraquecer seus irmãos mais velhos ao apresentar boas
cenas de ação (toda a sequência no México e o combate no trem são as melhores),
mas renegar a catarse em seu fim, quando entre seguir e parar, o herói toma uma
decisão que causa estranhamento.
Por
estar embebido de questões pessoais envolvendo o passado de James Bond e suas
ligações com o vilão, este poderia ser um filme que se desenrolaria como o
terceiro ato de Skyfall, que também
abraçava os fatos que levaram o herói a ter se tornado o sujeito que é. Porém,
a necessidade de funcionar como epílogo atrapalha a obra, que sente a obrigação
de oferecer ao espectador mais assíduo da série citações ao espírito dos longas
anteriores, seja através de arquétipos clássicos (o grandalhão Hinx, vivido por
Dave Bautista, que possui unhas de metal capazes de esmagar o crânio de um
homem, exagero que o aproxima de Jaws e Oddjob), seja através da inclusão da
própria SPECTRE na narrativa, mesmo que esta tenha pouco a ver com a
organização de outrora.
Tantas
homenagens à série acabam dando ao longa uma cara de último capítulo da
franquia, em vez de filme que fecha um ciclo, impressão ratificada pela
aparição de um personagem querido – cuja revelação não é essencial à narrativa,
além de mal ajambrada dentro do terceiro ato. Fica a impressão de que Sam
Mendes e seus roteiristas não entenderam que fizeram parte de uma engrenagem,
uma história que existe há mais de cinquenta anos e que não acaba por aqui. Por
isso, incomoda tanto a situação em que o protagonista se encontra quando os
créditos começam a subir. Parece que a franquia perdeu de vista seu caráter
original de representação dos tempos, como se 007 se rendesse a questões
pessoais que ofuscam o bem-estar do planeta. James Bond foi pioneiro em muitos
pontos no cinema de ação, é verdade, mas a quadrilogia estrelada por Daniel
Craig termina infelizmente entregue a convenções.
Spectre, Sam Mendes, 2015
4 comments:
vi poucos 007. vi os de Craig e acho que apenas mais 1 dos antigos. so gosto de verdade do skyfal
Esse me soou forçado e aqule papo de vilão que causou tudo de ruim na vida do heroi não me convenceu.
"E foram felizes para sempre!"
Ótimo texto, meu bem!
Eu gostei do filme, daria mais uma estrela. Mas realmente, peca. Essa necessidade de ligar todo o mal do mundo a alguém do passado do Bond me pareceu aproximar o personagem ao Super Homem, por exemplo: um sujeito com muitas habilidades, sempre pronto pra ação, que sempre carregou o mundo nas costas. Por um lado é interessante, mas desumaniza o sujeito. E o final, uma notória releitura da conclusão do A Serviço Secreto de Sua Majestade, também é fraco.
Eu adorei o Waltz voltando a brincar de malvado, mas a Bellucci foi um desperdício de uma baita atriz.
Eu gostei do filme, daria mais uma estrela. Mas realmente, peca. Essa necessidade de ligar todo o mal do mundo a alguém do passado do Bond me pareceu aproximar o personagem ao Super Homem, por exemplo: um sujeito com muitas habilidades, sempre pronto pra ação, que sempre carregou o mundo nas costas. Por um lado é interessante, mas desumaniza o sujeito. E o final, uma notória releitura da conclusão do A Serviço Secreto de Sua Majestade, também é fraco.
Eu adorei o Waltz voltando a brincar de malvado, mas a Bellucci foi um desperdício de uma baita atriz.
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