Na
tendência da Disney de reviver suas histórias mais famosas através de filmes
com atores, era questão de tempo até que A
Bela e a Fera (1991), uma das maiores commodities do estúdio (elogiada por
crítica e público, chegou a receber uma indicação ao Oscar de Melhor Filme, um
feito impressionante para uma animação, principalmente na época em que apenas
cinco produções eram indicadas ao prêmio da Academia), ganhasse também uma versão
em live-action. Porém, mesmo fazendo parte do mesmo movimento de revitalização
de contos, filmes como Alice no País das
Maravilhas (Tim Burton, 2010), Malévola
(Robert Stromberg, 2014), Cinderela
(Kenneth Brannagh, 2015) e Mogli: O Menino Lobo (Jon Favreau, 2016) possuem narrativa opostas: alguns preferem recriar o
original, enquanto outros simplesmente utilizam personagens e ambientação para
renovar o conto. Qual seria a linha adotada dessa vez?
A
trama, escrita por Stephen Chbosky e Evan Spiliotopoulos, acompanha Bela (Emma
Watson), uma menina com pensamentos modernos demais para a França do século XVIII.
Vivendo com o pai, Maurice (Kevin Kline), em um pequeno vilarejo, a jovem é o
patinho feio do lugar, sofrendo preconceito por sua transgressão (uma mulher que
sabe ler é aparentemente algo impensável) e ciúme por ser tão bonita. Sua
beleza encanta o galã Gaston (Luke Evans), que se dedica a torná-la sua esposa.
A vida de Bela é morosa demais, pelo menos até Maurice, fugindo de um bando de
lobos, entrar nos domínios da Fera (Dan Stevens), um monstro que vive isolado
em um castelo, e ser aprisionado. Bela vai resgatá-lo, e acaba se tornando ela
a prisioneira, em troca da libertação do pai.
A Bela e a Fera
replica, em muitos momentos, o original. As canções são refilmadas quadro a
quadro e alguns diálogos são reproduzidos palavra por palavra, tudo para jogar
com a memória afetiva daqueles que se encantaram com a animação nos anos 90.
Falta ao diretor Bill Condon, no entanto, sensibilidade para transformar a
versão em carne e osso da história em algo que seja tocante. Sua direção extremamente
formal e sua experiência com musicais acaba transformando o longa em uma obra
que só parece ganhar corpo nas canções, bem coreografadas e filmadas de forma a
fazer os fãs suspirarem. No resto da projeção, no entanto, o conto carece de
vida.
O
texto não consegue trabalhar a aproximação do casal principal, preferindo
perder tempo com explicações acerca do passado dos personagens, adições que soam
desnecessárias e deixam o filme inchado. Os protagonistas só começam a se
apaixonar lá pela metade da projeção, quando o espectador já está cansado de
ver um remake sem a menor preocupação em ser original. E Condon, que poderia
dar alguma personalidade ao longa, não consegue, nem mesmo com quarenta e cinco minutos a mais
de duração em relação à animação, fazer com que o amor de Bela e Fera, assim
como a vilania de Gaston (de pateta a bandido), não surjam repentinas e mal-ajambradas.
Os
momentos em que A Bela e a Fera
consegue se sobressair, ironicamente, são aqueles em que a narrativa tenta se
modernizar. A paixão de Le Fou (Josh Gad) pelo patrão Gaston aborda a
sexualidade de uma maneira corajosa e possivelmente inédita no cinema infantil norte-americano.
E Bela é ainda mais independente nessa nova versão (e a presença de Emma Watson,
uma feminista das mais atuantes em Hollywood, deixa a força da personagem ainda
mais palpável), e a cena em que a heroína lava roupas enquanto ensina uma criança
a ler casa muito bem com sua decisão de não ceder às investidas de Gaston. Bela
está à frente de seu tempo e entende, assim como Merida (Valente, 2012), Elsa e Anna (Frozen,
2013) e Moana (Moana: Um Mar de
Aventuras, 2016) antes dela, que não precisa de um príncipe para livrá-la
daquela vida sem-graça ou das dificuldades em que se encontra quando é feita
prisioneira pela Fera.
Infelizmente,
o resto da produção não acompanha a bravura de Bela, e o resultado é uma obra
que se sabota o tempo todo, como os belos figurinos de Jacqueline Durran e o
design de produção de Sarah Greenwood, que teriam destaque maior se auxiliadas
por uma fotografia mais clara do que a aplicada por Tobias Schliessler, ou a
composição da figura da Fera, que poderia se beneficiar da maquiagem, mas que
perde e expressividade com os efeitos computadorizados sobre o rosto de Dan
Stevens. Curiosamente, os objetos animados do castelo (clássicos personagens da
animação, e que aqui recebem as vozes de atores do quilate de Ian McKellen,
Ewan McGregor, Stanley Tucci e Emma Thompson), completamente digitais, parecem
mais vivos do que o monstro de Stevens.
Este
era um remake inevitável de uma obra que fez muito dinheiro em 1991, ganhou prestígio
e se tornou um dos maiores produtos Disney. Infelizmente, perdido entre presentear
os fãs com cenas idênticas e se colocar no cenário contemporâneo que o estúdio vem
pintando para suas princesas nos últimos anos, Bill Condon e seus roteiristas
não conseguem dar nova vida a um dos contos mais famosos do cinema. A Bela e a Fera até tenta ser moderno,
mas está preso ao passado.
Beauty and the Beast,
Bill Condon, 2017
2 comments:
Excelente texto. Mas não curti Emma watson no papel.
acho que a atriz jamais consegue parecer assustada quando deveria e continua com os viceos de Hemione de achar que tudo que fala e algo brilhante.
Chorei horrores no início. Gostei bastante do filme. Não é meu live-action preferido da Disney, mas gostei.
Amei a montagem e o texto.
Post a Comment