Parece
meio contraditória essa afirmação, mas Westworld
– Onde Ninguém Tem Alma, de 1973, é um clássico discreto: mesmo tendo
influenciado muitas produções futuristas nas décadas que se seguiram, com sua
ideia original (principalmente para a época) de um parque de diversões temático
que vive um dia de pesadelo após um problema técnico que faz as coisas saírem
do controle, é um longa que humildemente se conforma com um segundo plano. Fica
à sombra, inclusive, das produções que não existiriam antes dele e de seu
sucesso moderado, numa época em que a ficção científica lançava olhares
assustados e pessimistas para um futuro em que o Homem seria dominado pelo computador.
Entre
as histórias influenciadas pelo longa, o rebento mais claro talvez seja Parque dos Dinossauros, que replica e
atualiza muitos dos conceitos da obra que fora lançada vinte anos antes. Estão
lá o centro de controle, com técnicos e cientistas que mantém o parque sob
constante supervisão (e a crítica à maneira irresponsável com a qual o ser
humano lida com os avanços tecnológicos), e as horas de horror enfrentadas por
homens comuns, tendo que lidar com algo que até algumas horas antes, era apenas
objeto de admiração e divertimento. Não é nenhuma surpresa, portanto, ver o
nome de Michael Crichton ligado aos dois projetos.
Crichton
já era um autor experiente (aos 31, já tinha uma dúzia de romances publicados,
a maioria sob pseudônimo; viria a publicar o romance Parque dos Dinossauros em
1990, dezessete anos depois) quando estreou no cinema, comandando uma trama que
seguia um roteiro também escrito por ele. De seus trabalhos prévios na
literatura, ele tira o modo econômico que exibe os conceitos do parque Delos
(suas três arenas, Westworld, Romanworld e Medievalworld são apresentados de
maneira disfarçadamente didática, através de um repórter que entrevista pessoas
que acabaram de voltar do lugar) e seus protagonistas (Peter Martin e John
Blane, vividos por Richard Benjamin e James Brolin, são introduzidos já a
caminho da ação).
A
trama acompanha Peter e John enquanto eles ingressam no Delos para uma estadia
de duas semanas. O Westworld é uma simulação da fronteira norte-americana nos
anos 1880, com a única diferença de que no lugar de atores representando os
moradores da cidadela, estão robôs quase idênticos a pessoas reais. O que distingue entre homens e autômatos está nas mãos (“eles ainda estão trabalhando
para aperfeiçoar as mãos”, diz John em um momento). Nos primeiros dias, os
amigos se divertem em bordéis e participando de brigas de bar e tiroteios
(principalmente contra o pistoleiro robô interpretado por Yul Brynner), com
armas que possuem um sensor que as impedem de disparar contra seres humanos.
Em
algum momento, logicamente, tudo vai dar errado. Há algum tempo as máquinas
(não só substituindo homens e mulheres, mas também os animais, de cavalos a
cobras) vêm apresentando falhas técnicas que as impedem de responder aos
comandos do computador central. A princípio, as panes geram problemas simples,
como um robô que recusa a sedução de um cliente no Medievalworld (que recria as
dependências de um castelo), mas aos poucos os problemas tomam contornos
bastante violentos.
Crichton,
a despeito de suas habilidades como escritor, parece mais confortável como diretor
do que como roteirista. Dedica tempo à construção e à
escalada do clima de tensão (dando certo destaque mesmo aos outros dois setores do Delos onde John e Peter não vão), através da forma com que filma o retorno diário do
pistoleiro de Brynner atrás dos protagonistas e o nervosismo que vai tomando
conta dos técnicos na central de comando conforme as máquinas vão parando de
obedecer às suas ordens. O texto é tímido, se limitando a justificar o caos no
parque com a velha desculpa da “pane técnica” que gera o mal funcionamento dos
androides, mas ganha redenção com uma direção competente, mesmo que (com
exceção do último tiroteio entre John e o pistoleiro) raramente memorável.
Westworld – Onde Ninguém
Tem Alma desperdiça algumas chances de ouro, principalmente na
exploração dos ambientes do parque. Os curtos 86 minutos de duração da obra
impossibilitam certa paciência na hora de apresentar as três arenas e tudo que
os hóspedes têm o direito de fazer com os figurantes biônicos do Delos,
principalmente devido à duração elevada da perseguição do transtornado
Pistoleiro a Peter no terceiro ato. Uns 20 minutos a mais e um cuidado maior na exploração
daquele universo poderiam dar à produção uma aura urgente de filme
indispensável na ficção científica hollywoodiana dos anos 70. O que é inegável,
porém, é a eficiência de Westworld
como diversão escapista e como referência para muito do que foi feito nas
décadas seguintes.
Westworld,
Michael Crichton, 1973
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