Desde Reds, de 1981, um filme não emplacava indicações nas quatro
categorias de atuação no Oscar. David O. Russell foi o responsável pela quebra
do tabu com o bom (mas superestimado) O
Lado Bom da Vida, em 2012. Não satisfeito, no ano seguinte, repetiu o feito
com Trapaça, uma experiência
irregular que ganha cores mais vivas justamente em função do seu elenco, que se
entrega de maneira formidável ao bem-humorado conto policial do cineasta, em
sua tentativa de emular Scorsese.
De fato, se existe algo que salta aos
olhos durante os 138 minutos de projeção do longa é o talento de seu diretor na
condução do elenco. Russell já havia dado provas de sua competência como
diretor de atores em O Vencedor,
além do próprio O Lado Bom da Vida,
e agora parece celebrar o sucesso de seus últimos dois trabalhos ao escalar
para o elenco de Trapaça um amálgama
dos cast de seus dois trabalhos anteriores.
Não que isso represente um problema:
Christian Bale, Amy Adams, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence (além da
inspiradíssima, apesar de rápida, aparição de Robert De Niro) são os maiores
atrativos da narrativa inspirada em fatos ambientada em 1978 (e a recriação de
época é um dos pontos mais deliciosos da produção) que acompanha o golpista
Irving Rosenfeld (Bale) que, ao lado de sua parceira Sydney (Adams), acabou sendo
forçado a cooperar com o impulsivo agente federal Ritchie DiMaso em uma
operação que visava prender estelionatários mas que, aos poucos, passa a
investigar políticos e mafiosos, usando Carmine Polito (Jeremy Renner), o
boa-praça prefeito de New Jersey, como principal isca.
Uma pena que o roteiro, escrito por Eric
Warren Singer e reescrito por Russell, não dê conta de todo interesse que a
trama pode gerar no espectador, preferindo se desenrolar como uma versão pálida
de Os Bons Companheiros. A direção
de Russell também não faz o menor esforço para se distanciar daquela que é uma
das maiores obras-primas dos anos 90 investindo, inclusive, em planos que
remontam à maneira de Martin Scorsese de filmar, como na câmera que acompanha
os atores enquanto os créditos iniciais aparecem na tela, ou o significativo
plano no qual dois personagens olham para dentro do porta-malas de um carro (no
contra-plongé, claro).
A linguagem de Russell, no entanto, é
mais acelerada do que a utilizada por Scorsese em Os Bons Companheiros. Trapaça
não quer perder tempo: passa como uma flecha pela introdução dos personagens,
supondo que o espectador passará a se importar com eles no decorrer da trama (por
exemplo, o flashback que conta a ocupação do pai de Irving dura segundos; a
transição de volta para o presente, pelo menos, é bastante inspirada), concentrando-se
pouco nos golpes de Irving e Sydney, e correndo direto para a ação, ou seja, a
interação dos dois com DiMaso que, justamente por ser apressada em cena, não
passa do nível da superficialidade.
Aliás, ser superficial era um problema
que já afligia longas anteriores de David O. Russell, como o já citado O Lado Bom da Vida. Lá, como aqui, o
elenco afiado e o talento do cineasta em exibir a história que precisa contar
em uma embalagem super pop disfarçava o quão raso ele ia para desenvolver sua
trama. Assim como Irving (que penteia o cabelo pro lado a fim de esconder a careca), Sydney (que diz ser uma lady inglesa) e Richie (que se acha o James Bond, mas que na verdade ainda mora com a mãe), Trapaça finge ser algo que não é. Talvez fosse mais interessante se fosse mais honesto.
American Hustle, David O. Russell, 2013
American Hustle, David O. Russell, 2013
3 comments:
otimo texto. porém gostei muito do filme
Hoje eu acho o filme melhor do que quando vi.
Na época, achei meio arrastado.
Ótimo texto.
Um filme sobre fidelidade...
Post a Comment